Na parte anterior, tivemos a oportunidade de analisar em
detalhes todos os aspectos envolvendo a marcante acidez das lambics, que pode
parecer estranha para quem não está acostumado, mas que é capaz de despertar
verdadeiras obsessões uma vez que você esteja familiarizado com suas nuances.
Contudo, como vimos, a estranheza dessas cervejas belgas de fermentação
espontânea não se limita à acidez. O ciclo fermentativo das lambics e,
sobretudo, a longa maturação com leveduras do gênero Brettanomyces dá a essas cervejas aromas exóticos e peculiares,
praticamente impossíveis de serem encontrados fora do reino das cervejas
selvagens.
“Querido, o que estamos comendo? Não é aquele
yakissoba estragado mais uma vez, é?”
Fonte: www.flickr.com |
Esses aromas se manifestam em toda a sua complexidade e
sutileza em um dos subestilos tradicionais das lambics: as gueuzes. Gueuzes são
as “meninas dos olhos” dos produtores e apreciadores inveterados de lambics:
não porque elas sejam intrinsecamente superiores às versões com frutas, mas sim
porque, nelas, o produtor demonstra seu virtuosismo como blender e todo o
caráter do seu terroir e da
fermentação de sua lambic. Não havendo adição de sabores e aromas exógenos
advindos das frutas, nas gueuzes o perfil aromático da fermentação espontânea
se manifesta de forma mais contundente e transparente.
Uma história das
gueuzes
Lambics constituem o estilo mais antigo ainda em produção no
mundo cervejeiro. Há registros que permitem estabelecer, com algum grau de precisão,
que cervejas muito semelhantes às lambics belgas atuais já eram produzidas, com
os mesmos ingredientes e provavelmente de forma similar, pelo menos desde o
século XV, após a consolidação do emprego do lúpulo na produção cervejeira
europeia. O método de mostura típico das lambics atuais (a “mostura túrbida” da
qual já falamos aqui) provavelmente data da primeira metade do século XIX (e
foi minuciosamente descrito em 1851 sob o nome de “método belga”), mas os
ingredientes e a fermentação espontânea já funcionavam exatamente como hoje em
dia muito antes disso. O nome “lambic”, introduzido pelos franceses, já estava
em uso desde o final do século XVIII.
As gueuzes, por sua vez, são um estilo bem mais recente,
tendo surgido apenas no século XIX. Antes disso, toda lambic era vendida direto
do barril, sem carbonatação, com tempos de fermentação e maturação mais
abreviados do que os das atuais versões engarrafadas. As gueuzes sugiram no
século XIX (como quase tudo o que ainda fundamenta nossa cultura
contemporânea!) a partir da adaptação dos métodos empregados na produção do champagne. O produtor blendava lambics
com idades distintas, sendo que a parte mais velha havia envelhecido durante pelo
menos 3 anos em barris. Como a lambic jovem (de um ano de idade) ainda não
havia fermentado completamente, ela ainda possuía açúcares residuais a serem
fermentados. Por isso, após ser engarrafada, a mistura sofria refermentação na
garrafa, com produção de gás carbônico. Voilà!
A lambic passava a ser uma bebida espumante, como o champagne.
O detalhe da pintura “Feira flamenca”
(séc. XVI), de Pieter Brueghel (o Novo),
ilustra a forma como as lambics
eram consumidas até o
século XIX:
direto do barril.
Fonte: http://commons.wikimedia.org |
As gueuzes foram criadas como uma forma de apresentar uma
versão engarrafada, frisante e mais refrescante da lambic, passível de
distribuição ao mesmo tempo mais ampla e limitada, e mais adequada aos gostos
do mercado urbano crescente. Uma lambic para os tempos modernos, digamos assim.
A partir de 1860, Bruxelas começou a ser invadida por cervejas estrangeiras,
vendidas em garrafas e com espuma, como as pale ales inglesas e,
principalmente, as refrescantes lagers alemãs, que influenciaram os gostos e
modas do mercado. Para gerar carbonatação nas lambics, alguns produtores
começaram a misturar lambics jovens e velhas, ocasionando uma refermentação no
próprio barril – começava a surgir aí o embrião da gueuze. Contudo, os barris não
podiam ser transportados para muito longe e tinham uma vida útil limitada, já
que a cerveja se acetificava quando o barril estava pela metade. A gueuze
surgiu, nesse contexto, como forma de distribuir a cerveja engarrafada, em
quantidades mais limitadas (não era preciso que um único estabelecimento
consumisse o barril inteiro, minimizando os efeitos negativos da concorrência
com outras cervejas, e tornava-se possível vender para clientes particulares),
atender aos gostos em transformação do mercado e garantir a comercialização
para outras praças.
A primeira menção conhecida a lambics engarrafadas data de
1844, e sem dúvida refere-se a uma versão pioneira e experimental de gueuze
destinada ao mercado externo. Contudo, o estilo demorou a se consolidar e
disseminar. Ainda em 1875, experimentos para a refermentação na garrafa da
gueuze, baseados nas técnicas de produção de champagne, redundavam em garrafas explodindo de tanto gás carbônico
criado pela fermentação – Brettanomyces
são leveduras vorazes! A Exposição Mundial de Bruxelas, em 1897, divulgou esse
novo produto como uma das especialidades do país, tornando-o conhecido em
escala nacional e internacional e aumentando sua produção e consumo. Hoje em
dia, a comercialização da gueuze ultrapassa de longe, em volume, a da lambic
sem blendar.
O belo rótulo da Lindemans Pecheresse
é inspirado
no estilo art nouveau,
remetendo à
época de popularização
das lambics engarrafadas.
Fonte: www.noblegreenwines.co.uk |
Há controvérsias a respeito da origem do nome gueuze (ou de
sua variante corrente, “geuze”). Alguns autores defendem uma hipotética (e
pouco provável) etimologia a partir de “gaz” (“gás” em francês), denotando a
carbonatação do estilo. Contudo, o adjetivo gueuse
já existia em francês, língua falada na região de Bruxelas. Gueuse (feminino de gueux) significa “mendiga”, mas seu campo semântico podia se
estender os sentidos de “malandra”, “falsa” ou “enganadora”. Em 1883, Jean
d’Osta escreveu ao jornal L’Indépendence
Belge sobre as gueuzes: “On disait de
cette boisson un peu traîtresse: quelle gueuse, quelle friponne, quelle
coquinne de bière.” Ou seja: “Afirma-se, a respeito dessa bebida um tanto traiçoeira:
que malandra, que velhaca, que marota essa cerveja.” A afirmação possivelmente aludia
ao fato de as gueuzes se parecerem mais com vinhos espumantes do que com as
demais cervejas, mas não serem tão caras quanto os champagnes. Elas são radicalmente diferentes da maioria das ales e
lagers, mas estão razoavelmente próximas do vinho espumante pela secura, pela
acidez e, e partir daquele momento, também pela carbonatação, justificando sua
denominação como bebidas “enganadoras”.
Os aromas animais
A longa maturação da gueuze é a grande responsável pelo seu
perfil aromático maduro e equilibrado, que se revela lado a lado com a acidez
volátil, captável pelo olfato. Como vimos, os aromas produzidos pelas Brettanomyces demoram bastante para se
desenvolverem, sendo suaves na lambic jovem, servida direto do barril. Contudo,
como a gueuze emprega uma parcela de lambic envelhecida por três anos, ganha a
complexidade aromática plena da longa maturação. Para o apreciador habituado às
ales e lagers, os aromas da gueuze parecem simplesmente “estranhos”, “fora de
lugar” – a mesma impressão que alguns bebedores das nossas pilsens de massa têm
ao se depararem pela primeira vez com uma ale belga forte carregada de ésteres,
fenóis e álcoois superiores. Demora um pouco até que nossos sentidos comecem a
se habituar com todo esse novo universo. A primeira impressão causada pela
gueuze no nariz advém da acidez volátil, que percebemos como um aroma genericamente
“azedo”, levemente semelhante ao do iogurte (já que o ácido predominante é o
lático). Em alguns casos, em segundo plano, também podemos sentir leves toques
acéticos, lembrando vinagre – mas eles são secundários e podem nem mesmo se
manifestar em alguns rótulos especialmente “limpos”.
Na sequência, vêm os aromas normalmente descritos como
“animais”. O mais importante deles corresponde a um composto fenólico denominado
4-etil-fenol, produzido por Brettanomyces
(portanto, ausente nas cervejas não selvagens). Trata-se de um aroma de
difícil definição, canonicamente descrito como semelhante a “cobertor de
cavalo” (aquela manta que fica entre o pelo do cavalo e a sela de couro, e que
absorve o suor do animal durante a cavalgada). Para quem não cresceu em um
haras ou em uma fazenda, fica complicado imaginar o que seria isso. Esse aroma
também é descrito como semelhante a “couro” (não o couro curtido e tratado dos
calçados e bolsas, mas aquele tipo de couro cru, mais rústico), “estábulo”,
“zoológico”, “palha”, “feno” e mesmo “sal de frutas”. Alguns enófilos descrevem essa característica (muito recorrente nos vinhos tintos da região da Borgonha) como semelhante ao "odor sensual de corpos humanos". Os americanos, desistindo
de procurar uma definição precisa, chamam-na simplesmente de “funky” (“fedor corporal”, mas
com uma conotação levemente positiva de algo “descolado”) ou “Brett” (em
referência às leveduras que o produzem). A indicação “Brett” é imprecisa, na
medida em que o 4-etil-fenol corresponde a apenas uma pequena parcela dos
aromas produzidos por esse gênero de leveduras. Pode ser difícil descrever em
palavras esse aroma fenólico - ele transmite a sensação de algo orgânico, animal, pungente, selvagem e vagamente sexual -, mas basta sentir o cheiro de uma gueuze para
identificá-lo sem erro!
Limpadores especiais para cobertores de
cavalo, presumivelmente para os
desafortunados jóqueis que
detestam lambic.
Fonte: www.leathertherapy.com |
O exotismo animal das lambics não para no “cavalo”. As Brettanomyces também produzem grandes
quantidades de compostos caprílicos – os mais comuns são os ácidos caprílico,
cáprico e caproico, que têm um aroma que lembra muito queijo de cabra (ou sabão
de louça em barra) e pode até ter remissões florais e terrosas. Ésteres formados
a partir do ácido caproico podem reforçar essa percepção “orgânica” com
remissões a suor ou sebo. Traços caprílicos podem estar presentes em outros
estilos cervejeiros, mas normalmente como defeito associado à autólise de
leveduras. Nas gueuzes, por outro lado, eles complementam de forma agradavelmente
rústica o perfil animal da cerveja. Por fim, existem em algumas lambics, em
baixas quantidades, substâncias chamadas tetra-hidropiridinas, que manifestam
um aroma de “rato”, nem sempre considerado positivo. Aromas terrosos e
similares a mofo por vezes complementam essa gama de características mais
“rústicas” de uma gueuze. A intensidade e o equilíbrio dos aromas animais pode
variar de cervejaria para cervejaria, de barril para barril. Algumas gueuzes exibem
um perfil de “cavalo” bem forte, enquanto outras possuem um perfil aromático
menos fenólico/animal e mais esterificado/frutado. Isso não deve ser
interpretado como defeito, mas como parte da proposta de cada produtor e da
particularidade de cada terroir.
Limitar a tipicidade de uma lambic aos traços animais é uma simplificação
grosseira.
Frutas frescas
Outro traço típico do aroma das gueuzes são suas
características frutadas, advindas das grandes quantidades de ésteres
produzidos pelas Pediococcus e pelas Brettanomyces. Normalmente demoramos
mais para percebermos e nos familiarizarmos com esses delicados aromas frutados
do que com os exóticos traços animais do estilo, mas não se engane: o perfil
frutado de uma gueuze é tão intenso quanto o animal. Basta aprender a
identificá-lo. A primeira dica para tanto é dar tempo ao tempo: muitas gueuzes
manifestam primeiro suas características animais, enquanto o perfil frutado,
como um bicho semisselvagem e desconfiado, espreita de longe por muito tempo
antes se revelar claramente. Não beba sua gueuze depressa demais: saboreie-a
lentamente, deixe-a aerar um pouco na taça, como se faz com um vinho tinto,
para permitir que o aroma frutado se desenvolva de forma plena.
Degustadores com experiência em ales belgas estão muito
familiarizados com os aromas frutados advindos dos ésteres produzidos pelas
leveduras do gênero Saccharomyces.
Nas ales e lagers, os ésteres mais frequentes são o acetato de isoamila (cujo
aroma lembra banana ou pera), o hexanoato de etila (com remissões a maçã vermelha,
um “frutado” genérico e anis) e o butirato de etila (que lembra abacaxi em
calda, damasco seco ou frutas amarelas). Esses aromas costumam passar uma
sensação de “fruta madura” ou de “bala/doce de fruta”. Contudo, os ésteres
presentes nas gueuzes são um pouco diferentes. Isso ocorre porque os ésteres
são uma família de compostos químicos derivados de reações entre ácidos e
álcoois. Uma lambic possui, em grande quantidade, ácidos que estão pouco
presentes nas ales e lagers, como o lático ou os da família do caprílico. Como
resultado, os ésteres formados também são muito diferentes: entram em cena os
lactatos, caprilatos e afins, enquanto os ésteres mais típicos de ales e lagers
vão sendo metabolizados e absorvidos. Também é muito comum o acetato de etila
(derivado do ácido acético), que pode remeter a “frutas (tropicais)” ou, em
concentrações excessivas, a solvente e acetona. Por isso, a paleta de aromas
frutados/esterificados de uma lambic não lembra o “frutado de doce” das ales e
lagers. Pelo contrário, o “frutado” presente nas lambics é mais “agudo”,
lembrando frutas mais frescas e o aroma frutado dos vinhos brancos e espumantes.
É muito frequente a associar os ésteres de uma gueuze a uvas verdes, o que
reforça a impressão geral de similaridade com o vinho espumante. Contudo, há
inúmeras nuances: em algumas gueuzes, sentem-se remissões a peras, abacaxi
fresco, groselha, cereja, maçã. Em outras, o aroma pende mais para o lado
cítrico do limão, laranja ou mesmo grapefruit e maracujá. É importante frisar que esses traços frutados não se confundem com a acidez: alguns degustadores, sugestionados pela similaridade entre a acidez da lambic e de algumas frutas, denominam "frutado" (referindo-se normalmente a limão e outras frutas ácidas) aquilo que, na verdade, é apenas a acidez da cerveja. O aroma de ésteres, mais perfumado, lembra frequentemente uma essência concentrada da fruta, como a impressão produzida pelo fruto bem maduro, por compotas ou sucos em pó.
Se os vinhos brancos fossem mulheres... A
voluptuosa
Chardonnay e a arisca Sauvignon Blanc.
Imparcial o ilustrador, não?
Fonte: winefolly.com |
A comparação com vinhos brancos se impõe. Frank Boon, cervejeiro
à frente da cervejaria Boon, afirma que o caráter frutado de uma lambic deve
estar próximo ao de um vinho produzido com uvas Chardonnay – isto é, levemente
doce, maduro e opulento, lembrando mel e frutas tropicais. Isso descreve
admiravelmente bem o perfil de algu mas gueuzes (não consigo deixar de pensar
nas safras mais recentes da Cantillon); contudo, para mim, outros rótulos pendem
mais para o aroma mais seco, cítrico, rústico e até “herbal” de um vinho
produzido com uvas Sauvignon Blanc. Em qualquer um dos casos, o frutado das
gueuzes não é aquela sensação de doce das ales e lagers, indo mais para o lado
do frescor e da agudeza de frutas ácidas e brancas. Quando os sentidos estão
afinados, uma boa gueuze abre todo um horizonte de frescor frutado.
Oxidação e madeira
Não nos esqueçamos: gueuzes são feitas, pelo menos
parcialmente, a partir de cervejas com 3 ou mais anos de idade. Isso significa
que são bebidas com um perfil de cerveja madura, lembrando às vezes características
que encontramos em cervejas envelhecidas ou bem maturadas. Duas características
típicas de maturidade mostram-se muito comuns em gueuzes. A primeira é um aroma
e sabor lembrando mel, que se faz acompanhar de uma sensação ligeiramente
licorosa. Essa sensação de mel, provocada pelo surgimento de álcoois
superiores, mescla-se às frutas e, muitas vezes, é responsável pela leve
percepção de doçura de algumas gueuzes mais delicadas, bem como pelo caráter
aromático mais “voluptuoso” lembrando Chardonnay.
A segunda característica de maturação de algumas gueuzes é
um aroma típico de oxidação, originário de uma substância chamada benzaldeído.
O benzaldeído exala um elegante e sóbrio aroma mineral-terroso lembrando muito
vividamente o sabor das amêndoas cruas (não as torradas) e do marzipã. Embora
mais presente em lambics com cerejas devido a reações químicas com a fruta, ele
também brilha em gueuzes com predominância da parte mais antiga do blend – como
pode ser observado de forma clara na Geuze Mariage Parfait da cervejaria Boon, por exemplo.
Por fim, é preciso lembrar que as gueuzes são fermentadas e
maturadas em barris de madeira. É verdade que a maior parte dos produtores usa
barris antigos e evita que a madeira imprima traços muito evidentes à cerveja.
Contudo, nesta ou naquela lambic, podem ser percebidos aromas e sabores amadeirados (frequentemente lembrando
madeira seca) e abaunilhados, vindos da interação com a madeira. Não espere a potência abaunilhada, tostada
ou de coco de algumas imperial stouts e barley wines envelhecidas em barris –
nas gueuzes, a madeira deve ser um elemento discreto e secundário para não
ofuscar as Brettanomyces.
Os imponentes foudres da cervejaria Boon. Lembre-se
deles da próxima vez que algum engraçadinho vier
dizer que as barrel-aged beers
são uma
inovação dos norte-americanos.
Fonte: http://beer-trotter.blogspot.com.br |
Acaba aí? Não! A complexidade aromática das gueuzes é
imensa. Os aromas animais/fenólicos, esterificados/frutados e de maturação
consistem na parte mais substantiva e típica do perfil aromático de uma lambic,
mas não o esgotam. Ao lado deles, surgem ocasionalmente aromas condimentados,
terrosos, traços sutis de malte e cereais e até mesmo, em alguns casos, raros
rastros de lúpulo. Uma boa gueuze abre um horizonte amplo de aromas para o
deleite do degustador aventureiro!
Taninos
Por fim, como já falamos dos gostos básicos das gueuzes ao
comentar a acidez das lambics, resta comentar seu último atributo sensorial: a
sensação na boca. Como sabemos, devido à superatenuação causada pelas Brettanomyces, gueuzes são completamente
secas. Além disso, são altamente carbonatadas e frisantes, resultando em uma
sensação de crocância e leveza. Algumas vezes, exibem uma sutil licorosidade
lembrando vinho, mas nunca devem se mostrar encorpadas ou pesadas. Lambics são
como bons aperitivos: abrem o apetite, mas não o saciam.
Contudo, também não devem ser aguadas. Em parte, a
carbonatação é responsável por isso, “enchendo” a boca e produzindo uma textura
frisante. Contudo, outro componente essencial das gueuzes que evita a sensação “aguada”
são os taninos. Já tivemos a oportunidade de falar um pouco sobre taninos
quando discutimos o amargor das lambics. Taninos advêm das grandes quantidades
de lúpulos usados para fabricar as lambics, e também provêm da madeira, sendo
que a secura do corpo acentua sua percepção. Além de contribuírem com uma leve
sensação amarga, os taninos fecham nossas glândulas salivares, causando uma
sólida sensação adstringente de “secura” e de “amarrar” ou “grudar” a boca. Às
vezes, sentimos os taninos nos lábios, que se grudam levemente aos dentes e
parecem perder um pouco da sua “lubrificação”. A sensação é semelhante (mas em
muito menor grau) à de comer uma banana verde.
Taninos dão estrutura e solidez à sensação de uma gueuze na
boca, impedindo-a de parecer rala apesar da altíssima atenuação de açúcares.
Além disso, ajudam a dar mais persistência à sensação que a cerveja deixa na
boca depois de ser engolida, potencializando seu final. Taninos são sensações
típicas de vinhos e, em alguns deles, podem ser extremamente agressivos e
“crus”. Nas gueuzes e lambics em geral, porém, a concentração dos taninos não
chega ao nível de um vinho, dificilmente adquirindo um caráter excessivamente
agressivo e adstringente. Quase sempre, os taninos de uma gueuze enriquecem a
experiência que ela nos proporciona.
Na próxima parte desta matéria, veremos como isso tudo
funciona na prática, a partir da degustação comparada de seis gueuzes
tradicionais! É hora de abrir as garrafas e encher os copos!
Excelente texto. Bastante completo e repleto de nuances. Obrigado por compartilhar. Tomei uma gueuze muito boa hoje e fui presenteado por esta bela explanação.
ResponderExcluirSaúde, Leo, obrigado pelo comentário!
ExcluirÓtimo conteúdo!!!!
ResponderExcluirQue bom saber que você gostou do texto, saúde!
Excluir